domingo, 15 de março de 2009

It takes two to tango


A diferença básica entre a Web 1.0 e a Web 2.0 é exatamente a unidade que o nome sugere: um a mais, o usuário. O que, no início, era uma relação unilateral, com empresas e pessoas postando conteúdo em seus sites 1.0 para quem os acessasse, torna-se bilateral – e, consequentemente, multilateral -, a partir do momento em que é facultado ao usuário o direito de gerar, selecionar e personalizar o conteúdo dos sites.
A mudança de nomenclatura serve para marcar o momento de uma transformação importantíssima na cultura virtual e na forma como a sociedade interage com a web, de um modo geral. Isso, por si só, valeria a marca 2.0, até pelo didatismo de marcar um momento a partir do qual antigos conceitos são reformulados. Na Web 2.0, o usuário não mais acessa os sites, mas participa deles, interage com outros usuários e reproduz a vida social num ambiente virtual mais democrático e pessoal que o anterior, da Web 1.0.
As novas tecnologias foram fundamentais para essa mudança de parâmetros, mas diante da velocidade com que as tecnologias se superam nas últimas décadas, é a mudança sociológica proporcionada pelo advento da Web 2.0 que chama mais atenção. Isso porque o foco da web sai do conteúdo e se volta ao usuário, que com ele se mistura. Perfis pessoais, agrupamentos em torno de interesses em comum, tags, rankings, postagens e comentários nada mais são que expressões individuais compartilhadas. A partir daí, assim como fisicamente, em um estádio, torcedores se agrupam sob a chancela de uma torcida, no ambiente virtual formam-se grupos sociais baseados nos interesses e afinidades dos usuários, a partir, justamente, das informações que eles compartilham com os outros.
Os sites 2.0, personalizados de forma que a cada usuário é exibida uma página principal diferente, possibilitam, inclusive, uma espécie de apropriação de hardware, já que, ao executar o login, o internauta passa a ter, em qualquer máquina conectada, todas as suas configurações pessoais disponíveis.
Dessa forma, a principal diferença entre Web 1.0 e Web 2.0 parece ser o foco da atenção, sendo que, na primeira, ele está no conteúdo postado pelo gerenciador dos sites e, na segunda, no usuário.
Alguns autores classificam o foco da Web 2.0 como sendo o conteúdo – produzido pelos usuários. Na minha opinião, essa é uma leitura equivocada, já que a publicação desse conteúdo só é possível porque o foco está no usuário. Dessa forma, o conteúdo que o usuário publica na Web 2.0 é apenas conseqüência da autonomia e da importância que ele detém nesse modelo. Importante considerar, também, que grande parte desse conteúdo é nada mais que a expressão da individualidade desse usuário – dados pessoais como idade, sexo, interesses, gosto musical e até preferências gastronômicas.
Na Web2.0, o usuário deixa de ser o “acesso número 105.698”, por exemplo, para ser um avatar de sua representação real. Ao acessar um site como Facebook, Orkut, Youtube ou MySpace, cada usuário ganha nome e sobrenome (reais ou fictícios, de acordo com a sua escolha), amigos, ambientes que gosta de freqüentar, músicas que gosta de ouvir, e se expressa por meio das saudações, comentários, textos, fotos e vídeos que publica, personalizando sua “existência virtual” e influenciando o comportamento virtual de outros “N” usuários que com ele interagem.
Essa é a verdadeira revolução. A Web 2.0 possibilitou a entrada de pessoas na rede, transformando os passivos leitores/consumidores de conteúdo, que antes orbitavam em torno dos websites, em núcleos autônomos, interligados e, sobretudo, críticos. A Web 2.0 marca o momento em que o usuário se apropriou da web, que deixou de ser a “casa alheia”, aberta à visitação, para ser a megalópole que abriga a casa de cada usuário.
Alguns críticos dessa mudança de nomenclatura argumentam que a Web 2.0 é nada mais que a mesma Web 1.0 em evolução, ou seja, que mudar o nome não passa de uma jogada de marketing. No entanto, uma conjunção tecnofilosófica que transforma números em indivíduos parece merecer, no mínimo, um novo nome. Que seja, então, 2.0, para lembrar que a web só “acontece” quando há mais de uma pessoa envolvida, mais de uma ponta ou mais de um começo. Afinal, “it takes two to tango".

Um comentário:

  1. Isso resume tudo, Lilica:

    "No entanto, uma conjunção tecnofilosófica que transforma números em indivíduos parece merecer, no mínimo, um novo nome."

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